domingo, 22 de fevereiro de 2015

Texto crítico de AL-CHAER



Para onde converge a poesia visual de Tchello d’Barros?

Estamos diante de um artista que tem no olhar a principal ferramenta. Ferramenta diariamente lubrificada pelo sentimento. Neste “olhar preciso” de “sentimento raro”, Tchello d’Barros promove um incansável encontro. Seu “olhar” convida o nosso “olhar” para um abraço visual.

Atribui-se ao “Ovo” do grego Símias de Rodes como sendo o primeiro poema visual conhecido (três séculos antes de Cristo). Mas eu diria que a origem da Poesia Visual está nas pinturas rupestres e nos ideogramas. De lá pra cá, a visualidade na poesia passou por várias experimentações, caminhos e vertentes, até que foi criado o termo Poesia Visual (muito contestado e que alguns estudiosos preferem chamar de poesia inter-semiótica). Mesmo que contestada a denominação, mesmo que contestada a própria Poesia Visual, a Poesia Visual está aí, com esta nomenclatura e é um movimento poético de abrangência mundial, em que o Brasil é um dos países com vários expoentes na produção e divulgação desta forma de arte. O passado recente foi muito generoso com as artes visuais e a Poesia Visual se beneficiou de heranças como os caligramas, o letrismo, o Dadaísmo, o Surrealismo, o poema concreto (este sim é um termo “brazuca” que foi incorporado pelo Mundo afora), a Pop Art e, mais recentemente, com a revolução digital, o aparecimento das possibilidades que o hipertexto propicia (imagem, movimento e som).

A poesia visual de Tchello d’Barros dialoga com todos estes movimentos, mas não é apenas um diálogo de reconhecimento. O mais impressionante na construção de sua poética visual é o eixo que a norteia: há uma coerência em que clareza e simplicidade são cúmplices. E uma objetividade que nos faz concluir que, se Tchello sente com o “olhar”, ele “pensa” com um trabalho rigorosamente planejado e cuidadosamente estabelecido em um cronograma sem fim. Seu “olhar” não pára de trabalhar.

E, sabedor da importância da Poesia Visual, mais do que expor seu talento, Tchello tem uma obsessão que é a itinerância da mostra Convergências, uma obsessão que não é narcisística. É uma obsessão didática, pois nos caminhos que percorre, Tchello procura manter contato com estudantes e artistas, através de palestras e oficinas, paralelamente à mostra. Nestes contatos, Tchello ensina e aprende, pois tem a missão de promover, através da Poesia Visual, a discussão das artes visuais e de sua função como objeto cultural e transformador.

Não é fácil destacar alguns poemas visuais da mostra Convergências, pois a obra de Tchello d’Barros é para ser vista/percorrida no todo. Contudo, coube a mim esta honra e desafio. Mais honra que desafio. Pois a primeira se basta e o segundo não se esgota.

No poema visual “Eternidad”, Tchello nos apresenta a solução poética do moto-contínuo que é a eternidade, com uma simplicidade que é a alma-gêmea da genialidade. A roda. O giro. A palavra interminável. E, colocado o título em Espanhol, a tradução para a Língua Portuguesa aglutina o primeiro “E” ao último “E”, caracterizando mais ainda a universalidade do tema.

O que gosto muito na poesia visual de Tchello d’Barros, além da construção visual em si, são os títulos. Não apenas pela explicação, mas pela pertinência de sua sensibilidade incomum na junção de palavra e imagem. Nós temos a Capitu de Machado de Assis. Na minha maneira de ver, “Olhar ralo” é a Capitu, na versão Tchello-visual. O que era oblíquo, agora é ralo. O que era dissimulado, agora se esvai e se esgota.

Outro foco de Tchello é utilizar da Poesia Visual para denunciar e combater, como no poema “Preconceito”. Neste poema o leitor não fica imune, nem impune. Independentemente de tamanho, cor, todos nós temos o mesmo valor e o mesmo significado. Somos todos de uma mesma “fonte”. E é uma tarefa de todos nós extirparmos o preconceito, a segregação, os rótulos. Apropriando-nos deste tema, podemos extrapolar o sentido para a própria arte, que deve ser vista sem preconceitos, com necessidade de “abertura” e não de classificações, nem reduções.

A poesia visual de Tchello d’Barros não caminha sozinha. Vem junto às demais faces deste Tchello-multi-tudo: poeta, designer, desenhista, artista plástico, poeta visual, fotógrafo, artista digital, haicaísta, cordelista, cronista, promotor cultural, palestrante, viajante e profundo conhecedor da história das artes.

Nos idiomas, as palavras envelhecem, algumas chegam a morrer. Da maneira rara como Tchello as vê, as palavras se tornam mais jovens. Da forma surpreendente, criativa e talentosa como Tchello nos mostra, as palavras nos rejuvenescem. Assim também o é com os traços, com as formas e com as imagens.

A mostra Convergências não mostra tudo, mas revela: revela um Tchello d’Barros convergindo nossos olhos para esta viagem de ida pela Poesia Visual.

Mas, um aviso! O bilhete é só de ida. Sem volta.

AL-Chaer
Poeta

Novembro de 2009

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